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Entrevista com Izabel Gurgel, jornalista graduada pela UFC e a atual diretora do Theatro José de Alencar.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

> Trabalha há mais de 18 anos nos cruzamentos da cultura x comunicação

 

1-Izabel, fale-nos um pouco sobre você, sua carreira e como conseguiste chegar a diretora do Theatro José de Alencar (TJA).

 

Sou público do TJA há mais de 20 anos. É a relação mais forte que tenho com a instituição. Parte do meu aprendizado de público, de aprender a ser platéia para as artes foi no próprio TJA. Em 1991, quando da reinauguração do TJA pós restauro iniciado em 1989, com mais dois colegas de faculdade - os jornalistas Jacílio Saraiva e Dora Freitas - fizemos a cobertura da reabertura do TJA para o Diário do Nordeste. Anos depois, trabalhei na casa como assessora de imprensa. Na virada dos 90 e até 2002, integrei o núcleo gestor cuidando da área de comunicação e projetos. Desde março de 2007, dirigimos o TJA com Silêda Franklin, funcionária pública com mais de 29 anos de serviço.

 

2-Esse ano é comemorado 103 anos do TJA gostaria que você nos falasse um pouco sobre a importância sócio-cultural que o Theatro vem desenvolvendo para a comunidade cearense nesse período.

 

Quando o TJA surge na Fortaleza de 1910, o que chegava à cidade era a concretização de um desejo coletivo que vibrou na segunda metade do século 19: o desejo de dotar a cidade um grande teatro, de uma casa de ópera, que colocasse a cidade no circuito de solistas e grandes companhias que faziam a América do Sul, vindo, sobretudo da Europa e da Ásia. Fortaleza tinha, então, cerca de 50 mil moradores. A cidade era, de certo modo, o núcleo urbano mais concentrado entre as atuais avenidas Dom Manuel, do Imperador e Duque de Caxias. Ou seja, a área que hoje é o Centro de Fortaleza. Passados 105 anos do início da construção e os primeiros 103 da inauguração - o TJA foi inaugurado dia 17 de junho de 1910 -, sabemos que mudaram os modos de viver na cidade, mudou o entorno imediato do TJA, mudou o Centro. E mais, com usos e ocupações distintos, mudou o próprio TJA.  Perguntamo-nos se não é um momento favorável para dizer de outro lugar para o TJA, de outro lugar para a produção artística do Ceará na cena do TJA. O centenário foi um momento em que a instituição ficou mais exposta ainda, mais aberta ainda. Exposta em suas precariedades e deficiências, exposta em sua pujança de vida, em seus modos de uso, de ocupação, de povoação pela cidade, pelos que visitam a cidade. Pensamos que é um momento especial para dizer: o TJA é sim um centro cultural de mais de 12mil metros quadrados que recebe grandes solistas e grupos internacionais, por exemplo, e é também o espaço a partir do qual a produção artística do Ceará se conecta com o mundo. Somos acolhedores de solistas e grandes espetáculos de vários lugares e somos também produtores de grandes solistas, de grandes espetáculos. A partir da produção artística do Ceará, temos um TJA conectado com o mundo.

 

3- Nas apresentações do Theatro existe financiamento privado? Se existe esse financiamento interfere na seleção das apresentações?

 

O TJA é mantido pelo Governo do Estado através da Secretaria da Cultura. Programações como o Festival Eleazar de Carvalho, Bienal Internacional de Dança do Ceará e a série de concertos da Orquestra Filarmônica do Ceará também recebem incentivos oriundos de fontes públicas e governamentais, com eventuais apoio da iniciativa privada, sobretudo através das leis de Incentivo à cultura (estadual e federal).

 

4- Segundo Bourdieu, sociólogo francês, a cultura está em perigo graças a intervenção do fator lucro no processo criativo e na divulgação da arte. Acontece essa intervenção no TJA, no que consistem as apresentações e a escolha dos artistas a se apresentarem?

 

Sim, quando Bourdieu fala da ameaça ao processo de autonomização da arte por conta da ordem-mor do mercado, compreendemos que se torna um desafio maior trabalhar a formação de públicos. Assim, um centro cultural como o TJA, público e governamental, pode e deve realizar atividades que o chamado 'mercado' não realizaria e são potencialmente formadoras de público, são potencialmente atividades que ampliam nossa experiência de mundo.

 

5-Para finalizar, o que a população cearense pode esperar do TJA para os próximos anos?

 

Que a reforma possa expor ainda mais o TJA que temos, em diálogo com as experiências variadas que o TJA viveu, mas, sobretudo acenando para um tempo outro, que estamos a construir desde já. Como diz o Darcy Ribeiro no livro  O Povo Brasileiro, refererindo-se ao Brasil (não sabemos como será o Brasil daqui a 50 anos, mas será diferente do que é hoje. Cabe a nós inventar o Brasil que queremos), invoco para o TJA: vamos pensar um TJA para além do que foi pensado e do que foi feito, um TJA que incorpora nossos saberes, mas também trabalha com o que não sabemos. Será que vivemos, em algum momento da nossa trajetória - de cidade, de Ceará, de TJA - o TJA em sua plena potência? Talvez, em meio à reforma seja enriquecedor como experiência coletiva pensar que o TJA pode muito mais em nossas vidas, na vida da cidade, na vida do Ceará. Que o inesperado nos faça uma surpresa.

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